Sunday, April 29, 2007

PEDRA E ALMA

No meio da pedra havia material mineral duro e sólido. Naquela manhã ensolarada não havia poesia. Um homem de dentes podres, fedido e com o rosto escondido atrás de uma barba longa e empiolhada atirara uma pedra na portaria; estilhaços de vidro fizeram uma constelação no chão brilhante. Uma senhora estava apavorada "meu bondoso Deus, como anda a violência". Uns tres homens riam da cena quando uma senhorita assustada, segurando seu cãozinho, passara em direção ao carro estacionado. "Vejam só os seios dela, apontados pra lua, que gostosa", julgaram os tres canalhas. O mendigo gritava: "eu quero café com leite e um pão de sal com manteiga". Mais uma pedra na mão. Os porteiros permaneciam com medo. Não restou outra saída a não ser chamar a polícia. O odor daquela área nobre era delicioso, cheiro de limpeza. Os prédios tinham nomes chiques: Havaí, Paris, Washington, Miami, Londres. A polícia nem fez soar as sirenes. Ouviu os populares e os que estão inclusos na classe média alta. Veredictum: o mendigo ia ser levado para o xadrez. E lá foi ele. Aos gritos: "quero pão de sal com manteiga e café com leite". Ao virar a esquina, os porterios varrem os estilhaços. Tudo voltou ao normal. Naquele prédio tinha moradores que lutavam pelos animais que ficavam perdidos, abandonados na rua. Não é demagogia, é realidade. Aquela senhorita de peitos lindos e com marquinhas de praia, gasta cerca de R$ 600,00 ao mês para sustentar Sansão, seu amado cachorrinho.
Ao chegar no quinto distrito, o mendigo foi jogado numa cela. Estava na hora do almoço, do rango. Ganhou a quentinha e, esfomeado, meteu os dentes podres no feijão. E mordeu uma pedra, pequena. Cuspiu a pequena pedrinha. Pedra que pode ser poesia. Mas no meio de um homem há uma alma. Em todos homens há uma alma. Inclusive os filósofos e teólogos cristãos vivem afirmando.(Geraldo Magela)

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